EDITORIAL

Caros amigos,

Neste momento de drama, tragédia e violência, estamos ao lado da população israelita, exposta a um ataque que nem ela, nem todo o povo judeu, tinham conhecido desde a criação do Estado de Israel ou desde os anos negros do nazismo e da Shoah.

Estes momentos são também um imenso desafio para nós, Associação Hagadá, e para o mundo dos Museus, sabendo do papel essencial que estes desempenham nas nossas sociedades.

Tal como os seus pares, o nosso futuro Museu parte da História e dos seus factos para os transformar em conhecimento, cultura e ensino para todas as gerações.

Os valores da tolerância, da abertura de espírito e do humanismo que defendemos são os mesmos que foram agora postos em causa pelo desencadear do ódio e da violência de um grupo terrorista.

Enfrentemos este desafio com toda a comunidade dos Museus, em particular com os da Associação dos Museus Judaicos Europeus (AEJM), da qual somos membros e cuja mensagem reproduzimos aqui, mas também com os representantes de todas as comunidades e culturas religiosas.

A nossa Associação estará, através da criação do nosso futuro Museu e durante muito tempo, na vanguarda daqueles que, pela sua própria existência e pelas suas ações, defendem estes valores do humanismo e da tolerância, caros às nossas sociedades democráticas.

A Direção
Associação Hagadá – Tikvá Museu Judaico Lisboa

EM DESTAQUE
Tikvá Museu Judaico Lisboa em Madrid

Conferência anual da AEJM - Association of European Jewish Museums

O vice-presidente da Associação Hagadá, Jean-Jacques Salomon, e o Diretor Executivo da Associação, Manuel Pizarro, estiveram em Madrid, Espanha, onde tiveram lugar duas reuniões com entidades relevantes dedicadas ao património judaico ibérico.

No dia 7 de setembro, reuniram com Esther Bendahan, Diretora de Cultura do Centro Sefarad Israel, e Israel Doncel, Diretor de Comunicação do mesmo centro. Trata-se de uma instituição pública criada em 2006 pelo Ministério de Assuntos Exteriores, União Europeia e Cooperação, a Comunidade Autónoma de Madrid e a Câmara Municipal da Capital espanhola que pretende aprofundar o estudo do legado da cultura sefardita como parte integrante e viva da cultura espanhola, bem como fomentar um maior conhecimento da cultura judaica e promover o desenvolvimento de vínculos de amizade e cooperação entre as sociedades espanhola e israelita.

Por sua vez, a 8 de setembro, decorreu a reunião na Fundación HispanoJudia, nomeadamente com a sua Diretora, Mónica Sánchez Rubio, e com Frédérique Ohayon, diretora de assuntos internacionais. Esta instituição tem a cargo, entre outras atividades, a concretização do projeto do Museu Hispano-Judaico em Madrid.

Para além das apresentações das respetivas missões e objetivos, foi feita uma primeira análise de possíveis projetos de colaboração a desenvolver no futuro, unidos pelo desejo de salvaguarda e comunicação do legado material e imaterial judaico ibérico.

WORKSHOPS
I Workshop - Toledo na gestão da Nova Arqueologia Judaica na Europa

Museo Sefardí de Toledo

O diretor Executivo da Associação Hagadá, Manuel Pizarro, participou em Toledo no I Workshop dedicado à arqueologia judaica na Europa, organizado pelo Museo Sefardí de Toledo.

Sob coordenação de Arturo Ruiz Taboada, arqueólogo e professor da Universidade Complutense de Madrid, contou com a participação de relevantes investigadores, tais como Philippe Blanchard (INRAP, Institut National de Recherches Archéologiques Préventives, França), Paul Salmona (Diretor do MAHJ – Museu de Arte e História do Judaísmo de Paris), Leonard Rutgers (Universidade de Utrecht), Ricardo Izquierdo (Catedrático da Universidade de Castilla-La Mancha), entre outros investigadores. Tratou-se de um relevante encontro, onde houve lugar para reflexão sobre os achados arqueológicos do passado judaico, tendo por objetivo criar um espaço científico de intercâmbio de novidades académicas a nível local, nacional e europeu, bem como destacar o valor singular da cidade de Toledo dentro do mapa arqueológico judaico em Espanha.

As sessões podem ser visualizadas no canal de YouTube do Museu Sefardita de Toledo.

CULTURA E TRADIÇÃO JUDAICAS
Sucot
29 set. - 8 out. 2023

Sukkot (Feast of Tabernacles) (Das Laubhütten-Fest)- The Jewish Museum, New York

Sucot é uma das festas de peregrinação, como Pessah e Shavuot, e dura uma semana. Neste período, controem-se cabanas com o objetivo de relembrar e reviver a travessia judaica pelo deserto, mas também, de uma forma mais global, para melhor compreender a fragilidade e a precariedade da existência humana.

CULTURA E TRADIÇÃO JUDAICAS
Simhat Torá
8 out. 2023

A Festa do Regozijo da Lei [Simchat Torah] na Sinagoga de Leghorn [Livorno], Itália. Solomon Alexander Hart. Óleo sobre tela, 1850. Coleção do Museu Judaico, Nova Iorque, JM 28-55.

No dia seguinte ao final de Sucot, tem lugar Simhat Torá, a festa da Torá, que marca o final e, simultaneamente, o recomeço do ciclo de leitura anual, na sinagoga, dos cinco livros de Moisés, a Thorá. É uma festa alegre, durante a qual são retirados da Arca Sagrada os rolos da Lei, percorrendo o espaço da sinagoga sete vezes, em cortejo.

Nos anos 1960, os judeus soviéticos comemoravam este dia como um dia de resistência e identificação com as comunidades do mundo inteiro, reafirmando a herança milenária. Era costume, nesse dia, milhares de judeus juntarem-se nas sinagogas orando, cantando e dançando.

PERSONALIDADES
Isaac Abravanel

«O mais notável dos judeus nados e criados em Portugal no século XV»

Representação de um comerciante judeu do século XVII, frequentemente utilizada como substituto de Abravanel
Página de título de uma edição de 1647 do comentário de Abravanel sobre Daniel, Ma'yanei ha-Yeshu'ah.
Página de título da segunda edição do comentário de Abranavel sobre a Hagadá da Páscoa, Sefer Zebach Pesacḥ, de 1545

Isaac Abravanel, a mais célebre personalidade dos judeus portugueses, nasceu em Lisboa em 1437, oriundo de uma família da aristocracia judaica de Sevilha. Foi ministro da Fazenda de D. Afonso V e um eminente filósofo e exegeta da Bíblia. Servia a Coroa com o seu talento financeiro, sem nunca descurar o estudo das Sagradas Escrituras. Além dos estudos filosóficos, teológicos e bíblicos para os quais fora preparado pelo rabino de Lisboa Joseph Hayun, Abravanel conhecia bem a história e a filosofia grega e árabe. Sendo poliglota — além do português e do castelhano, falava o hebraico, o latim e o italiano — tinha acesso a diversos documentos e fontes. 

Do ponto de vista financeiro, conjuntamente com Guedelha Palaçano e Moisés Latam, deu também um importante contributo ao rei na guerra contra Castela. O auge da sua carreira política em Portugal ocorreu entre 1478 e 1481, tal como a sua fortuna.

Pai de três filhos e duas filhas, e apesar dos seus múltiplos compromissos políticos e financeiros, Abravanel mantinha a sua obra exegética, nomeadamente, comentários aos primeiros profetas e uma leitura crítica de Maimónides. A sua residência tornara-se, assim, um centro de debates intelectuais e também de decisão dos assuntos mais importantes sobre o destino dos judeus portugueses, à cabeça dos quais fora colocado. 

Tudo isto acaba com a morte do rei D. Afonso V, em Agosto de 1481. O seu filho e sucessor, D. João II, muda radicalmente a política do seu pai em relação à nobreza, desferindo um golpe decisivo no poder dos grandes senhores feudais, limitando os seus poderes económicos e judiciais e centralizando-os na Coroa. Entre estes estava o duque de Bragança, detentor de um terço de terras portuguesas e de lugares-chave no poder do Estado. A amizade com duque deixa Abravanel numa situação desconfortável e decide, assim, sair de Portugal a caminho de Espanha. 

Em Maio de 1485, foi sentenciado à revelia por D. João II a «cruel morte natural, e tanto que fôr achado e havido nestes reinos, logo seja enforcado e morra na forca, e esteja nela para sempre». Homem de uma fé profunda, Abravanel interpretou esta tragédia como uma punição divina por descurar as Escrituras e dedicou-se intensamente à redação dos seus comentários bíblicos. Mas esse interregno não durou muito. Em meados de Março de 1484, foi chamado à presença dos Reis Católicos em Tarragona. 

Espanha estava ainda em guerra com o reino árabe de Granada e a Coroa precisava de fundos para a travar. Conhecendo a reputação de Abravanel como antigo financeiro do rei de Portugal, este passou a estar ao serviço dos Reis Católicos, reorganizando as finanças do Estado e gerindo as fortunas de muitos nobres de Espanha. 

Em 1491, já se tornara agente financeiro da rainha, gozando da confiança dos dois soberanos, junto dos quais também era o porta-voz da comunidade judaica. Continuando a redigir os seus comentários bíblicos, Abravanel estaria longe de imaginar que um ano depois seria confrontado e envolvido numa das maiores tragédias do mundo judaico. As perseguições iniciadas em 1391 com conversões forçadas tinham-se agravado drasticamente com as leis de «Limpeza de Sangue» instituídas em 1449 e a instauração do Tribunal da Inquisição, em 1478, que já tinha levado conversos e judeus à morte pelo fogo em autos-de-fé. 

Apesar disso, e mesmo depois da tomada de Granada aos Mouros, em Janeiro de 1492, ninguém previa a decisão que os Reis Católicos iriam tomar e que seria o passo decisivo para a destruição do judaísmo ibérico: a 31 de Março desse mesmo ano, Fernando de Aragão e Isabel de Castela assinam em segredo o decreto de expulsão de todos os judeus dos seus reinos respectivos, assim como das outras possessões espanholas, como Maiorca, Sicília e Sardenha. A opção era o desterro ou o baptismo. Isaac Abravanel, em conjunto com o rabino Abraham Senior e outras personagens da elite judaica, tentaram anular a medida de expulsão. Junto da rainha, de quem era mais próximo, Abravanel procurou demovê-la numa audiência, posteriormente narrada no seu comentário ao Livro dos Reis, ao que a soberana terá respondido «Crêem que isto vem de nós? Foi Deus que colocou este desígnio no coração do Rei.».

O Édito de Expulsão foi publicado a 1 de Maio de 1492, desencadeando o pânico entre a população judia, que ainda esperava a sua revogação. Muitos refugiaram-se em Portugal, outros dirigiram-se para o Império Otomano, outros ainda acabaram por converter-se. Os reis tentaram tudo para manter em Espanha, através da conversão, Isaac Abravanel, Abraham Sénior e o seu genro Meir Melamed, assim como os judeus mais preeminentes da comunidade. Mas Abravanel resistiu e decidiu acompanhar os seus irmãos de infortúnio a caminho do exílio. 

Portugal estava fora de questão depois de tudo o que se tinha passado. Partiu então para Itália, num longo périplo que terminou em Veneza, em 1503, vindo a falecer aos 71 anos em 1508.  Em todos os pontos onde se fixou, com destaque para Nápoles, Palermo e Messina, Abravanel notabilizou-se sempre pela sua atividade quer como financeiro, quer como comentador bíblico e filósofo. Três das suas obras foram impressas e publicadas em 1505 em Constantinopla. À sua morte foi homenageado por parte das autoridades venezianas e pelas comunidades judaicas. Como escreve Roland Goetschel, «esta dupla homenagem reflectia bem a dupla vocação de um homem que soubera conjugar na sua existência, o particular e o universal, a política e a teologia, o pensamento e a acção».

Entrevista a Ricardo Maissa

O Tikvá Museu Judaico Lisboa celebra o Dia Internacional da Música com um pequeno vídeo sobre a pianista de renome internacional Nella Maissa (n. 1914-2014), através das palavras do seu filho, Ricardo Maissa, que honrou o nosso Museu com a doação do espólio da sua mãe.

EFEMÉRIDES 

Dia Mundial da Música
1 out. 2023

No Dia Mundial da Música, recordamos Nella Maissa (Turim, 1914 – Lisboa, 2014), relevante pianista e uma apaixonada pela música portuguesa. Filha única de uma família judaica, começou a sua carreira em 1933, em Turim. Em 1934, já tocava em Milão, Bolonha, Littorio, Parma e Roma. Em 1936, casou na sinagoga de Milão com Renato Maissa, cuja família era de origem judaico-portuguesa de Salónica. Em 1938, as leis antissemitas aprovadas na Itália levam a família a sair do país, sendo Portugal o destino natural, pois ambos tinham passaportes portugueses. Apesar de Portugal dificultar a entrada de refugiados, o casal conseguiu entrar no país em 1939 e Nella Maissa fez toda a sua brilhante carreira artística em Portugal. Deu o seu último concerto na Casa da Música, no Porto, em 2008, com 94 anos e 76 de carreira. Pela sua dedicação à divulgação da música e de compositores portugueses, foi condecorada com a Medalha de Mérito Cultural e com a Comenda da Ordem Militar de Santiago da Espada pelo Estado português.

EFEMÉRIDES 

Implantação da República
5 out. 2023

A data de 5 de outubro de 1910 marca o fim da monarquia e a implantação da República em Portugal. Esta data marca também o início do caminho para a liberdade religiosa, que um ano mais tarde dá origem à Lei da Separação do Estado da Igreja. Decretada a 20 de abril de 1911, pelo Ministro Afonso Costa: o Catolicismo deixava assim de ser religião oficial do Estado, o culto público passava a ser fiscalizado e parte dos bens da Igreja confiscados. Em 1912, a Comunidade Israelita de Lisboa é oficialmente reconhecida pelo Governo Republicano, 416 anos depois do Édito de Expulsão e quase um século depois da extinção da Inquisição.

CONFERÊNCIAS 

Conferência europeia "Youth-Action-Culture"
Caldas Rainha
13 - 14 nov. 2023

Nos dias 13 e 14 de novembro de 2023, realizar-se-á a conferência "Youth-Action-Culture", no Centro Cultural das Caldas da Rainha. O Plano Nacional das Artes, a Rede Europeia de Observatórios das Artes e da Educação Cultural, a Fundação Calouste Gulbenkian, a Escola Superior de Artes e Design das Caldas da Rainha, em articulação com a Cátedra UNESCO em Gestão das Artes e da Cultura, Cidade e Criatividade do Politécnico de Leiria e outras organizações nacionais e internacionais, unem esforços para discutir convergências estratégicas entre os sectores da juventude, da educação e da cultura, no sentido de conceber políticas que promovam os direitos culturais dos jovens numa sociedade democrática e, especificamente, o papel da educação cultural e artística para o desenvolvimento da cidadania cultural.

Mais informação disponível aqui.

CONFERÊNCIAS 

V Colóquio Internacional Diálogos Luso-Sefarditas
Castelo de Vide
9 - 10 nov. 2023

O V Colóquio Internacional Diálogos Luso-Sefarditas irá decorrer em Castelo de Vide, a 9 e 10 de novembro de 2023.

Estes colóquios são eventos culturais que procuram oferecer pontes de proximidade entre a investigação universitária e as comunidades locais, abertos à reflexão e ao diálogo científicos, à partilha e divulgação dos resultados de investigação, ao conhecimento e ao encontro da história da presença sefardita, especialmente nos territórios da Lusofonia, mas também nas suas manifestações de diásporas transfronteiriças e multiculturais.

Mais informação disponível aqui.

LIVROS INFANTO-JUVENIS 

The Very Best Sukkah: A Story from Uganda (2022)
de
Shoshana Nambi, ilus. por Moran Yogev. Kalaniot Books.

Sucot é a festa judaica preferida de Shoshi. Ela e os irmãos adoram decorar a sua sukkah, a cabana onde a família vai festejar. Mas quem ganhará o concurso anual de sukkah da comunidade ugandesa Abayudaya? Embora apenas uma sukkah possa ser a melhor, toda a gente ganha quando os vizinhos trabalham em conjunto.

PODCASTS  

Série de podcasts Le Mémorial de la Shoah

Le Mémorial de la Shoah propõe cinco novos programas: "A história não contada do salvamento dos arquivos da Shoah”; As exposições de Le Mémorial de la Shoah; Encontros no Auditório; "80 anos, 1942"; Exposição "A voz das testemunhas”. 

Informação disponível aqui.

FILMES 

Golda (2023)
de
Guy Nattiv.

Um thriller filmado à cadência do tiquetaque de um relógio que nos transmite a intensidade dos momentos dramáticos de decisões controversas e responsabilidades de alto risco que Meir – também conhecida como a "Dama de Ferro" de Israel, e, neste filme, magnificamente interpretada por Helen Mirren – enfrentou durante a Guerra de Yom Kippur em 1973. As suas ações, em circunstâncias impossíveis, decidiriam, em última instância, o destino de milhões de vidas.

Exposição itinerante “A Diáspora Judaica Portuguesa”

A Associação Hagadá juntou-se à Editora Chandeigne (Paris) na mostra da exposição “A Diáspora Judaica Portuguesa”, na sua versão portuguesa. 

Caso tenha interesse em receber esta exposição itinerante, contacte-nos através do nosso e-mail: tikva@mjlisboa.com.

Saber mais

Escreva-nos: tikva@mjlisboa.com

FICHA TÉCNICA
Coordenação editorial: Esther Mucznik 
Conteúdos e edição: Ângela Ferraz, Esther Mucznik, Manuel Morais Sarmento Pizarro e Maria João Nunes
Grafismos: Joana Cavadas

 

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